O não sentimento da ausência

Sabe aquele pensamento de que quando alguém ou alguma coisa te incomoda é porque algo em você, que você não gosta, foi tocado? É assim que me sinto em relação a alguns casais nossos de amigos.

Domingo estávamos no aniversário de um amigo seu que desde que eu conheço é parte de um casal que por vezes me incomoda. Me incomoda porque eles começaram a namorar antes; porque ele demonstrava estar muito apaixonado; porque ele fazia surpresas meticulosamente pensadas no aniversário dela; porque eles viajavam para cidades próximas apenas os dois; porque ele a chamou para morar com ele custeando a vida a dois; porque ele sempre postou e ainda posta fotos com legendas apaixonadas; porque depois de quase dois anos eles ainda embalam esse amor da mesma forma - ou pelo menos com bastante vigor.

Nenhum relacionamento é perfeito, claro. Sabemos de alguns problemas que ali existem, mas considero que o conjunto é harmônico. E é essa harmonia do conjunto que me incomoda. Tudo o que nos falta. Nossa relação é morna. A maior emoção em geral aparece nas brigas. Rompantes. Calorosos arroubos, arrombos, pedidos de socorro.

Aquele outro casal de amigos seus também me incomoda. Inclusive, muito por eles que eu acabei fraquejando no segundo final de semana que estava decidida a nunca mais olhar para a sua cara. A falta que ele sente dela. A vontade dele de estar com ela. O carinho dele por ela. O tratamento.. Tudo me afronta. E me afronta porque me força a olhar no espelho e ver que eu não tenho nada disso com você. Aliás, na verdade me escancara, mais uma vez, o seu descaso - e o meu também - por mim.

Daqui a uma semana e meia eu vou viajar. Em todas as conversas você só "brinca", diz que vai sair, vai fazer e acontecer. Uma vez, duas, talvez, vá lá, dá pra rir. Mas você nunca sabe medir a linha tênue entre a brincadeira e o deboche. Talvez um dia você tenha tido legitimidade para brincar com esse tipo de coisa, mas hoje? Hoje você, eu, todo mundo sabe que isso tudo passou de uma mera brincadeira, uma simples implicância.

Uma grande parte de mim está tomada pelo vazio de saber que não vou fazer falta. Pelo contrário, sinto que minha ausência será festejada. Porém, ao mesmo tempo sinto que estou perdendo tempo em pensar e sentir isso, porque acho que eu deveria estar em paz com essa realidade se eu continuo escolhendo ficar com você "apesar de" toda a falta que esse relacionamento me perpetua. Mas a gente manda em sentimento? A gente pode até tentar coordená-los, mas todos eles ficam ali alojados mesmo que escamoteados. Não dá pra tirar, dá apenas para acomodá-los em lugares menos penosos. É isso que eu tento fazer todos os dias, ao pensar e sentir toda essa indiferença.

Eu achei que depois de tudo o que aconteceu, de você sentir minha falta, as coisas seriam diferentes. Não são. Algumas formalidades extremamente elementares foram restabelecidas, mas a essência não mudou. E não vai mudar, porque é da minha natureza querer o romance e é da sua renegá-lo a quem te valoriza.

É como se eu estivesse há dois anos apenas ficando com você. Sabe aquela fase em que as pessoas propositadamente escondem sentimentos, camuflam emoções para não se comprometerem? Todo nosso relacionamento tem sido assim. Por isso que eu qualifico-o como morno, porque qualquer coisa que não seja entrega me parece medíocre. Eu sinto muito.

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